Hoje estou suando. Pelo corpo porque o frio de fora está menor que o frio de dentro. E no encontro da alma com ele, pelas lágrimas, porque esta simplesmente transbordou e não conseguiu achar lugar melhor pra jogar suas emoções pouco originais. Em alguns momentos a verdade parece ser a dura e simples. Aquela que com vários artifícios tentamos não enxergar, achando que realmente não existe. Do meu ponto de vista existente imediatamente agora, isso só prova o ponto. Parece-me nítido que só tentamos enxergar aquilo que é mais tolerável, não conseguindo entrar em contato com a realidade de nós mesmos. Talvez porque essa seja paralisante. Porque é óbvio que é. É simples. As coisas estão tão liquefeitas que a concretude das palavras é um meio inadequado para todo esse oceano. É preciso muito fogo pra transformar o oceano em rocha.
Todos os momentos que consigo acessar agora são tristes. E me parece que tudo que fiz até hoje pra tentar ressignificá-los foram tentativas idiotas pra preservar uma vida miserável. Os instantes de que me lembro são sozinhos. Sou eu, com mais dois amigos, num ônibus. E quem está só no banco sou eu, apesar da "amizade". Nas comemorações, as risadas não são crédito meu. Nas reuniões em família, simplesmente não tenho o que partilhar. Porque, ora, simplesmente não vivi. Não tenho histórias. E minha histórias e resume a isso, apenas. As vezes que não estive superam facilmente as vezes que estive, mas não são nem metade das vezes que quis estar. Os ruídos externos atrapalham as reverberações geradas pelas ondas dentro de mim mesmo e isso me irrita, apesar de ser inevitável. Veja, a verdade é inevitável e não há nada a se fazer a respeito. Ela está imposta e a vontade de mudança só demonstra a fraqueza. E, ainda assim, ao pensar que consegui entender tal faticidade acho-me superior a tudo isto. Só que não. É óbvio que não. Aliás, não há nada que me inclua nessa realidade tosca do que essa ilusão onipotente.
Pra variar eu consegui destruir algo bom. Sabendo que iria fazê-lo, continuei. Porque, provavelmente, sou o que sou mesmo. E pouco há o que se fazer com isso. Talvez esteja começando a entender que o filme eterno de minha vida dure apenas alguns minutos. O resto são apenas refilmagens. Até o roteiro pode mudar um pouco, mas a história será a mesma: uma história de não-histórias. Não há escapatória pra isso, infelizmente. A ilusão durou o que havia de durar e agora o fundo está sendo cavado novamente, pra se tornar ainda mais profundo e para que, nele, possa enterrar algumas outras coisas. Por sinal, garanto-lhe que o filme não fica mais feliz. Estou na idade do auge da felicidade e as coisas já estão péssimas. Achar que, conforme a vida se desenrola e, não só a quantidade dos problemas aumenta, mas eles também se tornam cada vez mais complexos, as coisas serão mais fáceis e simples é uma contradição por definição. Mas o que é a vida senão uma sucessão de passos evitados frente à morte? Ou seja, apenas uma série de contradições, uma atrás da outra, afinal a verdade está aí e, por não ser capaz de lidar com esta inexorabilidade, tentamos revoluções vazias.
Sou tão banal que tudo o que pensei por uma hora enquanto revirava na cama sem conseguir dormir já foi dito. É. Lembre-se de um aviso já dado: tudo o que aqui lê não é mais nada que uma tentativa - falha, diga-se de passagem - para achar sentido algum nesse monte de merda gotejante. É interessante que, aparentemente, tudo o que faço é ilusão de estar fazendo algo melhor. Como que uma vida em ascensão. Não. São apenas vírgulas desesperadamente buscando seu ponto final. Parece que posso soar distante de você. É, meramente, porque você dá ênfase às palavras que compõe o texto que é sua vivência. E eu simplesmente não consigo tirar os olhos da estrutura. Das vírgulas, dos travessões e do tão desejado ponto final. Você pretende ler o texto no fim e avaliar se ficou bom. Atualmente, estou escrevendo-o. Você também, pode pensar. Sim, mas você está preocupado com as palavras e... Não vou nem tentar argumentar. Já afirmei que rochas precisam de muito fogo, não é?
O que eu esperava, também? Não entendo toda a surpresa. Afinal, não se esperaria muito diferente de alguém tão patético. PARE! Você está achando que estou me martirizando. Estou. Mas porque é a realidade. Interpretada. Por mim. E é isso que importa. Porque sou eu que vivo minha própria vida. Então não me interessa seu julgamento. Obrigado, continuemos. Preciso desesperadamente parar com essa história de destruir as coisas boas por conta de uma fase. Ah, não. Não porque quero mantê-las. Mas porque elas são coisas boas. E não pretendo trocar com elas essas experiências ruins. Porque elas não merecem isso. E, sim, existem coisas boas. Não generalize. Não vou conseguir me segurar, desculpe-me: "Toda generalização é burra!". E, se o isolamento é a única forma... Então, que seja. Paciência. Não vejo outra opção, no momento. E, novamente, é só isso o que importa. A minha percepção atual.
Dou-lhe então uma saída. Justamente isso: uma saída. Uma saída de tudo e de todos. Volto-me, de novo, a mim mesmo. Ainda que seja apenas por um dia. Faça o que bem entender disso. E pretendo não usar muito mais delongas aqui, pois amanhã o sono irá acompanhar-me até às 16h. O mesmo horário que o vô voltava com o lanche da tarde. Não terei tantas memórias boas para acompanharem-me por todas essas horas que irão passar tão lentamente quanto lhes for conveniente. Mas não se iluda: não estarei sozinho. Cada pensamento, cada sentimento, cada sensação e todos meus temores estarão logo ao meu lado. E tornarão meu dia tão mais agradável quanto eu permitir-me vivê-los. Assim, quando não há o que fazer, é melhor tentar tirar o máximo de tudo. Ainda que toda situação espremida não gere nada além de um suco transparente e salgado de lágrimas. Pois as lágrimas são. São e isso já é suficiente para acompanharem-me. Da mesma forma que fui acompanhado por breves amizades e pessoas. Que, se entendeu o que leu, já, obviamente, não estão mais aqui. Bem como não estarão as atuais, daqui alguns anos. Até que o ponto final chegue.